Este artigo é uma revisão bibliográfica, sendo apresentadas as referências aos artigos científicos analisados, e ligações para todos esses artigos.
Numa área tão sensível como é a da nutrição, é essencial comprovar todas as afirmações, devendo os leitores adquirir o hábito de validar as informações apresentadas.
Introdução

As corridas de ultra endurance, caracterizadas por durações muito prolongadas, impõem exigências elevadas ao organismo, incluindo sobre o metabolismo do ferro. O ferro é essencial para a produção de hemoglobina e mioglobina, fundamentais para o transporte de oxigénio e, como consequência, para o desempenho físico.
Esta revisão bibliográfica analisa o impacto que o treino e competição para corridas de ultra endurance tem sobre os níveis de ferro no organismo, assim como os efeitos da deficiência de ferro no desempenho desportivo, os métodos de diagnóstico existentes e as estratégias de reposição do ferro nos casos de deficiência deste mineral essencial.
Causas para a Deficiência de Ferro no Organismo
O elevado volume de treino necessário na preparação para corridas de ultra endurance, assim como as próprias competições, podem reduzir os níveis de ferro devido a vários fatores.
A hemólise mecânica, causada pelo impacto repetitivo dos pés no solo, danifica eritrócitos, aumentando a perda de ferro (Peeling et al., 2014).
A sudorese (termo médico utilizado para designar o suor) intensa contribui para a eliminação de ferro, enquanto a inflamação crónica induzida pelo exercício prolongado eleva a hepcidina, uma hormona que inibe a absorção de ferro (Nemeth et al., 2004).
Assim, os fatores apresentados acima levam a que os atletas de ultra endurance apresentem uma prevalência elevada de anemia por deficiência de ferro, com reduções significativas nos níveis de ferritina sérica após períodos de elevado volume de treino e competição (Beard & Tobin, 2000).
Impactos da Deficiência de Ferro no Treino
A deficiência de ferro, mesmo sem anemia, compromete a capacidade de treino. A redução da hemoglobina diminui a capacidade de transporte de oxigénio, resultando em fadiga precoce e menor resistência aeróbica (Haas & Brownlie, 2001).
A nível muscular, a baixa disponibilidade de ferro afeta a função mitocondrial, reduzindo a produção de energia e a recuperação pós-exercício (Dellavalle & Haas, 2012).
Atletas com deficiência de ferro relatam menor tolerância ao esforço, maior perceção de fadiga e risco aumentado de lesões de esforço.
Diagnóstico da Deficiência de Ferro
O diagnóstico de níveis baixos de ferro envolve análises laboratoriais. Os principais biomarcadores incluem:
- Ferritina sérica: Indica reservas de ferro; valores abaixo de 20-30 µg/L sugerem deficiência (Peeling et al., 2014).
- Hemoglobina: Valores inferiores a 12 g/dL (mulheres) ou 13 g/dL (homens) indicam anemia (Beard & Tobin, 2000).
- Saturação de transferrina: Percentagem baixa (<20%) reflete disponibilidade reduzida de ferro.
- Ferro sérico: Embora menos específico, valores baixos corroboram o diagnóstico.
A avaliação clínica, incluindo sintomas como fadiga, palidez e intolerância ao exercício, complementa os testes laboratoriais.
Reposição de Ferro
A reposição de ferro visa restaurar níveis ótimos e melhorar o desempenho. As estratégias incluem:
- Suplementação oral: Sulfato ferroso (100-200 mg/dia) é comum, mas pode causar efeitos gastrointestinais. A administração com vitamina C melhora a absorção (Haas & Brownlie, 2001).
- Suplementação intravenosa: Indicada em casos graves ou má absorção, com administração de ferro dextrano ou carboximaltose (Dellavalle & Haas, 2012).
- Dieta rica em ferro: Consumo de carne vermelha, fígado, leguminosas e vegetais verdes, combinados com inibidores de hepcidina (ex.: vitamina C) (Beard & Tobin, 2000).
O acompanhamento médico é muito importante para monitorizar a resposta à suplementação e também para evitar uma potencial toxicidade.
Conclusão
O treino com muito volume para corridas de ultra endurance aumentam o risco de deficiência de ferro devido a hemólise, sudorese e regulação da hepcidina. Esta condição prejudica a capacidade de treino, reduzindo a resistência e aumentando a fadiga. O diagnóstico precoce, através de biomarcadores como ferritina e hemoglobina, é crucial. Estratégias de reposição, incluindo suplementação e ajustes dietéticos, são eficazes para restaurar níveis de ferro, melhorando o desempenho e a saúde dos atletas.
Referências Bibliográficas
- Beard, J., & Tobin, B. (2000). Iron status and exercise. American Journal of Clinical Nutrition, 72(2), 594S-597S.
- Dellavalle, D. M., & Haas, J. D. (2012). Iron status and physical performance in athletes. Journal of Sports Sciences, 30(1), 45-53.
- Haas, J. D., & Brownlie, T. (2001). Iron deficiency and reduced work capacity: A critical review. Journal of Nutrition, 131(2), 676S-690S.
- Nemeth, E., et al. (2004). Hepcidin regulates cellular iron efflux by binding to ferroportin. Science, 306(5704), 2090-2093.
- Peeling, P., et al. (2014). Iron status and the acute post-exercise hepcidin response in athletes. PLoS ONE, 9(3), e93002.